Meu Mundo Imaginário!

                       Meu Mundo Imaginário!


                    A menina e o Dragão. 
     Sabena maioria das vezes gosto de encarar a vida como se tudo fosse um jogo. Um jogo que eu nem sempre posso controlar. O jogador se chama destino ou acaso. Ele vive variando. Nesse jogo vivo arriscando minha sorte. Agora sou dependente dela. Sou tão dependente que mesmo ela me traindo de vez em quando não a deixo para trás. Não posso confiar nela, mas devo carrega-la comigo.
       A vida é malvada, você não acha? Ela me prende as pessoas, mas não prende essas pessoas a mim. Agora são mais de meia noite, e eu estou aqui tentando me livrar do sentimento que criei. É tão absurda essa minha sorte, logo agora que achei um pouco de felicidade em um ser semelhante a mim, ela me trai, muda de lado e se junta a outro humano, me jogando na poça d'água. Uma água cinza. Cinza igual a tristeza. O sentimento que criei se chama esperança. Por um momento tive a esperança de ter um novo amigo, mas o destino me arrancou essa esperança e esse amigo com brutalidade.
      Consigo ver as marcas de meu duelo com o destino, no meu mundo imaginário eu teria ganhado. Apesar de encarar a vida como um jogo não gosto de jogos, nem duelos, nem esperanças, nem sentimento algum. Gosto apenas de meu gigantesco mundo imaginário, pois lá sou egoísta e ninguém me julga.
       Esse jogo não faz sentido para mim. Já perdi o meu sonho. O meu objetivo. Acho que já não tenho por que continuar jogando. Me agarrando a coisas pequenas, tentando esquecer os fracassos. Essa droga de promessa sem jeito foi  me arranhando por dentro, e não terminou ainda. Tentei encarar isso sem me machucar, mas é como um ácido que me corroí lentamente. No momento sinto raiva e compreendo a preocupação dos outros, mas não me odeie por explodir de vez em quando, sou uma bomba, o fogo da raiva secou a água, por isso você não verá lágrimas em meus olhos.
     No jardim dessa depressão todos me  ignoram e eu jogo pedras neles, mas elas desviam com rapidez e perfeição. Recocheteando em mim. Então eu grito: - Chega! Não quero mais jogar pedras. Não quero mais ser uma bomba e nem quero viver nessa prisão. Não quero!
     Depois de meu minuto de aflição e chateação olhei para a prisão. Era escura e solitária e muito fria. Só eu estava ali - posso fugir. Tenho que fugir. Vou fugir -  pensei bem baixinho para não correr o risco de alguém perceber. Esperei ansiosa pela noite sem estrelas. Nunca havia estrelas no céu - cadê as estrelas do céu? Cadê? - As palavras ecoaram tristes pelo corredor da prisão. A noite chegou vazia e silenciosa, eu já fugi varias vezes, por isso terei muito cuidado. Como esperado. Estão me vigiando. Sai na ponta dos pés e cheguei até o muro transparente que me escondia, ninguém do outro lado dele me ouvia ou me via. Não fiz barulho, mas fui pega, corri, corri dentro da prisão, me perseguiam e eu corria. Caí no único lugar que ninguém me acharia.
- Impossível subir - disse a mim mesma, cai em um buraco fundo e obscuro, era extremamente alto, alto para mim que tenho apenas um metro e trinta e nove. Ah! Não lhe contei ainda o que sou? Tenho 15 anos, e sou diferente, não cresci,  tenho corpo de uma criança de 10 anos. Andei praticamente me arrastando para o canto, me escondendo da luz, me escondendo dos monstros, dos guardas. Passei um bom tempo ali, me escondendo de quem me escondia.
     Olhando rapidamente a cintilante luz do sol, que machucava meus olhos vermelhos vivos, vi os monstros irem embora. Eu estava presa por isso, por ter nascido diferente. Eu tremia de medo. De raiva. Não gosto do escuro. Não sei o que se esconde nele. O buraco era largo, mas a abertura em cima era menor, bem menor - alguém pode fazer uma casa aqui - pensei. De repente alguém bufou atrás de mim. Era alguém grande. Provavelmente um monstro gigante. Senti ele se mover lentamente. Meu coração quase parou quando olhei para trás.
      Um enorme dragão me observava. Ele era preto e azul escuro. Simplesmente deslumbrante. Corri desesperadamente para o mais longe possível dele. A essa hora já estava escurecendo, a luz dourada do sol se tornou cinza. Cinza igual a tristeza. Ela bateu nos olhos agressivos e tensos do dragão.
- Ele... Ele não está fazendo nada - pensei, e acho que ele me ouviu, pois se moveu para trás se escondendo mais ainda na escuridão. Os olhos amarelos que me lembravam o ouro, brilharam no escuro, e acho que os meus olhos também estavam brilhando, por que ele não parava de encara-los. Tive uma mistura de medo e felicidade no meu coração de gelo, por horas fitei o jovem dragão, o último dragão do reino, ou de qualquer lugar do mundo.
- Por que você ainda está aqui? - Perguntei em pensamento, ele não me respondeu, perguntei de novo e de novo, então perguntei em voz alta - porque você ainda está aqui? - Enfim uma resposta. O dragão mostrou uma das belas asas machucadas. Ele levou um tiro? Quem em sã consciência seria tão idiota a ponto de atirar no último dragão? Fitei o ferimento aberto dele, comecei a me sentir inquieta. Olhei para cima. Com certeza foi ele quem abriu esse buraco, olhei novamente para ele. Não estava mais com medo, muito pelo contrario, estava confortável até de mais. Passamos muito tempo ali, muito mesmo, e conforme o tempo ia passando mais me apegava ao dragão, e a cada minuto descobria uma coisa nova sobre ele.
      O ferimento da asa piorava cada vez mais, eu podia ajuda-lo, mas estava com medo de me aproximar. Eu conversava com ele, contei tudo para ele, e ele me ouvia, me olhava com olhos enlutados e me ouvia, e um dia em que conversávamos senti uma cor cinza irromper meu coração de escorpião, e chorei, chorei por que nasci diferente, chorei por nós dois ali presos naquele buraco escuro. Fiquei surpresa ao sentir as lágrimas correrem fervendo pelo meu rosto. Ainda sou uma bomba. O fogo não secou minhas lágrimas. Por que não secou? Não tenho costume de chorar pelo os outros, sou egoísta de mais para fazer isso. Mas dessa vez chorei, chorei alto, e o dragão me observava com olhos tristes.
- Pare com isso. Não me escute. Não me veja. Me ignore. Me odeie... É isso isso que todos fazem - berrei, foi impressionante ninguém ter me ouvindo berrar. Cobri meu rosto com as mãos e me encolhi no canto úmido. De repente senti a asa do dragão arrastar-me para perto dele. Não senti medo. Senti apenas o cheiro do sangue. Mas não sei dizer se era  meu ou  dele.
      Nasci diferente, sou coelho, sou escorpião, sou humana. Por isso agora estou aqui , abraçada com um dragão, um deslumbrante e fustigado dragão. Ele também é diferente, é macio e bem aquecido. Eu sou diferente, sou fria e dura, tenho pele de escorpião e forma e sentimento de humano. O dragão é semelhante a mim, ambos somos diferentes e maltratados, ambos estamos presos e  magoados. Mas ele é grande e bonzinho, eu sou pequena e desprezível, machuquei pessoas por nada. Olhei o céu e não vi as estrelas - cade as estrelas do céu? Cade? - Gritei chorando. Olhei para os olhos amarelos do dragão, e neles vi que ele também se perguntava a onde elas estavam.
    Olhei a asa machucada. Podia cura-lo. Minhas lágrimas podem cura-lo. Mas também podem machuca-lo ainda mais. É como se eu fosse a pessoa mais bipolar do mundo. Não estava confiante. Não podia correr o risco de feri-lo ainda mais. A essa altura já o amava o suficiente para hesitar antes de coloca-lo em perigo. Deslizei minhas mãos tremulas pela asa até achar o ferimento. Eu estava chorando ainda, eu não conseguia deixar as lágrimas caírem, minhas cabeça estava doendo a ponto de eu achar que ia morrer. Me joguei para trás e me encolhi no canto afastando-me. Os olhos dele me diziam "Sua covarde!" 
- Sim, eu sou covarde - disse em voz alta, o dragão parou de me ouvir, bufou e virou a cara me ignorando, não queria me ouvir mais. Então gritei em pesamento - isso é só porque eu te amo, posso não conhece-lo a muito tempo, mas...mas não posso nem pensar em machuca-lo. Não posso - olhei bem para ele, tao vulnerável que me dava vontade de abraça-lo e protege-lo. Sei que falando assim parece que estava apaixonada por ele, não estava nem estou. Também, não teria coragem de ama-lo dessa forma, ele foi iludido por alguém especial, uma humana. Eu iludi todos os amores que me apareceram ( todos os dois), eu sei que sou desprezível. Não quero magoa-lo. Mas quero ficar perto dele. Ele estava tão magro. Eu estou tão magra. Se continuássemos assim morreremos logo. Tenho que deixar de ser covarde, mas como eu faço isso?  
   Respirei fundo e olhei bem para ele. Seus olhos encaravam as sombras nas paredes de terra. Em que ele estava pensando? Aaah eu e minha curiosidade - sabe, gosto de encarar a vida como um jogo - ele nem me olhou, apenas ficou ali perdido em seu mundo preto e branco. Entre pretos e brancos existem os cinzas. Cinzas igual a tristeza. Sei que quando ele me olha vê a cor cinza. Me levantei com calma e elegância e segurei a asa machucada do dragão, ele balançou a asa com brutalidade me fazendo voar longe. Bati minha cabeça no chão úmido. 
   Minha visão ficou embaçada por um segundo, chacoalhei a cabeça e me levantei cambaleando. Lágrimas fervendo corriam pelo meu rosto, aparei uma por uma e esperei o dragão azul e preto parar de me odiar. Ele não parava. Me encarava com olhos amarelos exaltados. 
- Não me odeie. Não me odeie por favor. Eu sei o que estou fazendo - eu gritava desesperadamente. Não! eu não sabia o que estava fazendo. Ele se acalmou um pouco, eu me aproximei devagar segurando as lágrimas laranjas em minhas mãos. As soltei em cima do ferimento. Nada. Não aconteceu nada.
-Por que não aconteceu nada? - O dragão nem sequer olhava para mim. Ficava ali parado pensando. Pensando na sua querida humana - eu imagino - eu não podia fazer mais nada, então fechei os olhos e descansei. Não importava mais viver ou morrer. De repente acordei sendo puxada pelo pé, o dragão me puxou para fora do buraco voando, me carregou para perto das nuvens numa velocidade impressionante, e então me soltou. 
    Eu senti o vento no meu rosto me impedindo de respirar enquanto caia. Fechei os olhos e esperei o fim. Mas quando eu menos esperava o dragão me segurou de novo, me agarrei as suas costas enormes e enfim ele voou devagar. Reparei em suas asas estavam mais machucadas, muito mais.
- Me desculpe! - Cochichei. Eu entendi o porque dele sair voando comigo. Se for para sofrer que seja longe de mim. - Você me odeia!? - Disse a ele, não sei como ele conseguia voar com aquela asa. Eu até pensei em jogar minhas lágrimas em cima dela de novo, mas isso só nos machucaria ainda mais.
     Por que eu tinha que nascer tão pequena e desprezível?  Perguntava ao céu sem estrelas enquanto o dragão me carregava para fora da prisão... Uma estrela? Sim é uma estrela! 
- Olhe, olhe, é uma estrela - gritei ao dragão apontando para a estrela. Ele olho para ela e voou o mais rápido que podia, estávamos correndo perigo, a chuva de estrelas ia começar. Uma estrela quase nos acertou, desviávamos das estrelas e por sorte já estávamos perto de uma caverna. Entramos nela, eu desci das costas dele e fiquei olhando a chuva cintilante que fazia meus olhos vermelhos de coelho arderem - obrigada - disse para o dragão, e o barulho das estrelas era tudo que ouvíamos. 
   Me assustei ao ouvir o dragão sair voando sozinho. Não me preocupei. As estrelas não machucariam a pele do último dragão. Eu fiquei parada olhando o deslumbrante dragão me abandonar que nem todos os outros fizeram. Fiquei parada de baixo da chuva de estrelas vendo o destino ganhar o jogo e levar, de novo, minha felicidade. Me deixando assistir sozinha a chuva de estrelas enfeitada pela imagem de um dragão que diminuía conforme me abandonava sem nem sequer olhar para trás. 
  E eu fiquei ali parada, criando outro sentimento. Esperando. Imaginando. Torcendo para que, um dia ele voltasse para me buscar. Mesmo sabendo que ele nunca voltaria.

(2014. Paloma Medeiros) 

           Essa foi a Bia em ação bye bye...
 

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